Publicado em 02/2015
Escrevo à luz de velas depois de uma forte chuva que interrompeu o fornecimento de energia. Tudo está silenciosamente calmo. Não preciso de muito. A arte não precisa. A fraca luz amarelada me é suficiente. O cenário naturalmente poéticó é um presente da natureza. Ela sabe, não sou de inventar histórias. Tenho a vida inteira para me fazer artista. Mas agora, nesse instante, meu prazo não excede o tempo de uma vela.
Escrevo à luz de velas depois de uma forte chuva que interrompeu o fornecimento de energia. Tudo está silenciosamente calmo. Não preciso de muito. A arte não precisa. A fraca luz amarelada me é suficiente. O cenário naturalmente poéticó é um presente da natureza. Ela sabe, não sou de inventar histórias. Tenho a vida inteira para me fazer artista. Mas agora, nesse instante, meu prazo não excede o tempo de uma vela.
O papel em branco. A tela em branco. O silêncio antes da
música. As luzes acesas no cinema. O preto que antecede as cores da fotografia.
São pequenas frestas por onde escapam pedaços de gente. Partes bonitas e
sombrias. O que mais causa vergonha e também o que se quer mostrar. De alguma
forma, só os pedaços mais verdadeiros e humanos conseguem escapar. A
eles damos o nome de obras de arte.
Imagine o artista como uma nuvem pesada se dissolvendo em
pingos, alguns suaves e outros muito violentos. À medida que vai se desfazendo
e se transformando em sua obra, se sente leve, livre. Mas a chuva é passageira,
logo o céu estará azul de novo, pronto para receber outras nuvens carregadas. E
até as mesmas nuvens que se enchem novamente e se dissolvem e se enchem e se
dissolvem. A liberdade dura o tempo de uma tempestade. A liberdade dura o tempo
de um poema.
A grandissíssima amante da solidão é quem promove um
encontro com a assunção e a fuga em um só lugar. Então, o espanto. O olhar-se
no espelho e não se reconhecer. A arte é um rastro permanente desses
encontros. Quando se pode ficar em silêncio por mais de dois minutos e não é
necessário sorrir, falar asneiras, ou concordar com qualquer besteira que sai
da boca alheia. O artista se torna cada vez mais refém desses momentos.
Egoísta, desprendido e solitário para alcançar o máximo de si.
O reconhecimento ao se deparar com o o próprio vômito.
Embora não seja algo agradável de se imaginar. É exatamente assim.
Desconfortável e aliviante. Uma agressão libertadora. A vela está acabando.
Chegarei ao final e terei que reler para corrigir os erros e então me acharei tão
tola e ingênua. Indigna dos seus olhos que me acompanham, do minuto que roubo.
Mas nã há opção, se é aqui que me reconheço. Se essas palavras me soam mais
familiar do que a pessoa que vejo no espelho.
A arte é linda e cruel. Simples como uma vela que queima e
ilumina.